quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Um "cheirinho" de Leomil - de António de Seves

«Os arvoredos zumbiam como enxames distantes. Na negrura engaveladas  p´la noite no interior dos matagaes, a cada topo se representavam vultos de lobisomens e más mulheres tresmalhadas, que avançavam, em negra dansa, até ás clareiras geadas, onde o luar e o códo formavam poças luzentes.
Os rolos d´agua vertida dos açudes, mordiscados de coriscos, ou todos  luzidios e duma côr d´azeitona, eram como grados cobrões, de pele enfarruscada e nédia, que saíssem da repreza para mergulhar e se espojar no rio. 
Á beira dos calços, as giestas ganhavam, num repente, parecenças  com disparatados morcêgos que,    d´asas abertas, esperassem para investir.  P´las cristas e p´los tesos, os calhaus, compridos ou bogalhudos, com faíscas de luz nas aguas empoçadas, ensalviçavam como sapos desconchavados ou taludos lobos à espreita.
Nas chapadas de luz, nas serras descruadas, seixos e rebolos apareciam, à flor do chão, como ossos brancos d´esqueletos desenterrados por féras esfaimadas, esgadanhando com fúria.
Acinzentadas ou fuligentes, esvaídas p´lo luar ou aumentadas p´lo escuro, cobertas de querruvinhas e dentuças no bravejar do fraguedo e do mato, as serranias cresciam para o ceu, cheias da negra cisma de desabar sobre os campos.»

(António de Seves - no livro - Leomil  - Moimenta da Beira  - 1921

2 comentários:

  1. Olá Vivian, desde agora mesmo.

    Bom, se não for por mais nada, é engraçada a forma de dizer (ler) algumas palavras.

    Sempre interessante...



    Viviana, fique bem

    Abraços.

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  2. Querida Rosa

    Eu aprecio muito este tipo de escrita.
    Todas estas palavras e expressões que se deixaram de usar há muito...me fazem sorrir.

    Um abraço, boa amiga
    Viviana

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