terça-feira, 31 de outubro de 2017

CANÇÃO PARA A MINHA MÃE - Um poema de Miguel Torga

O poeta e escritor português  - Miguel Torga.

E sem um gesto, sem um não, partias!
Assim a luz eterna se extinguia!
Sem um adeus, sequer te despedias,
Atraiçoando a fé que nos unia!

Terra lavrada e quente,
regaço de um poeta criador,
ias - te embora antes do sol poente,
Triste como semente sem calor!

Ias, resignada, apodrecer
À sombra das roseiras outonais!
Cor da alegria, cântico a nascer,
Trocavas por ciprestes pinheirais!

Mas eu vim, deusa desenganada!
Vim com este condão que tu conheces,
E toquei essa carne macerada
Da vida palpitante que mereces!

Porque tu és a Mãe!
Pariste um dia aos gritos e aos arrancos,
E parirás ainda pelo tempo além,
Mesmo sem madre e de cabelos brancos!

És e serás a faia que balança ao vento
E não quebra  nem cede!
Se te pediu a paz do esquecimento,
Também a força de lutar te pede!

Respira, pois, seiva da duração,
Nos meus pulmões até, se te cansaste;
Mas que eu sinta bater o coração
No peito onde em menino me embalaste.

( Miguel Torga - No livro - Diário I)

2 comentários:

  1. Lindo! lindo! lindo!, como só Torga sente. Sentia, e transmitia em palavras.
    Obrigada amiguinha.
    Beijinhos.
    Dilita

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  2. Querida Dilita

    Tem razão, amiga

    Torga é Torga...

    A sua poesia é belíssima!

    Continua a ser o meu peta preferido

    Um abraço
    Viviana

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