O poeta português Pedro Homem de Melo.
CANÇÃO FATAL
Meu verso é falso. Com vaidade fria,
eu o escrevi, como quem talha um fato.
Hábil pintor, pintor de auto - retrato,
A figurar, de pé, na galeria.
Toda a canção do meu bailado mente.
Toda essa dança de canção inquieta
Serviu de farsa, máscara de gente,
Ao peso inútil, morto do Poeta.
Pus um cravo na boca...Nada mais,
Nos dedos, duas pérolas... E pronto.
E cada qual, extasiado e tonto,
Veio bater, faminto, aos meus portais.
Carne morena,olhos azuis, desdém,
Tudo ficou no patamar da rua.
E sete vezes me traiu a lua...
À minha alcova não subiu ninguém.
Nunca por nunca se derrubaram muros!
Neles a vida está. Vida é fachada,
E nunca, na mentira destronada
Os vermes deixam de mostrar-se, impuros...
Por isso agora, lúcido, vos brado:
(E ainda é volúpia a confissão tardia!)
- Poetas! brazas vãs na terra fria, -
Vendei mais caro a vossa Poesia,
E nenhum ceptro vos será negado!
(Pedro Homem de Melo - no livro - Bodas Vermelhas)