terça-feira, 29 de abril de 2014

IN MEMORIAN - - Vasco Graça Moura


O advogado e escritor Vasco Graça Moura - Fonte da imagem:   visao.sapo.pt -
Foi hoje  a sepultar, Vasco Graça Moura.

Advogado e escritor.
Um   homem exemplar.
Um português por inteiro.
Homens da sua estatura são raros em Portugal.

Há muito, que  o admirava.
Tinha por ele um enorme apreço  e uma elevada consideração.
Ah! quanto eu valorizo a sua obra!
Tudo...mas de uma forma muito especial, a sua poesia.
Poemas que eu lia em lágrimas e com um nó na garganta...
Tal era o sentimento que o escritor neles colocava...
Ele dizia, a respeito:
"A POESIA É A MINHA FORMA VERBAL DE ESTAR NO MUNDO".
E, triste, disse também:
"FALTA POESIA A PORTUGAL".

Por isso, no dia em que nos deixa, como sentimento de que todos perdemos alguém muito especial, eu, carinhosamente, dedico ao Homem Grande...Vasco Graça Moura, este poema tão belo e tocante, de um outro poeta:

NA MORTE DE UM POETA

Morreste sem um adeus aos teus irmãos,
Irmão Poeta,
quando a Montanha abraçava mais as suas árvores
e nasciam flores.

Agora as palavras não exprimem
quanto pesou aos teus amigos essa fuga
tão precipitada,
como se receasses que a eternidade acabasse
antes de a conheceres.
Agora todos os lenços são excessivamente pequenos
para acenar boa viagem á tua memória
e só na curva dos nossos olhos
se manifesta a saudade.

Irmão Poeta.

Fernando Guedes

(Fernando Guedes nasceu no porto em 1928.É um escritor e editor portugês que se dedicou á poesia, ás belas-artes e á história da cultura.)


E, naturalmente, não seria justo que eu não publicasse aqui e agora, um poema , que li, em lágrimas, da  autoria do português exemplar. Vasco Graça Moura:


 PARA UMA CANÇÃO DE EMBALAR

embalo a minha filha joana que acordou num berreiro. 
a casa está às escuras, vou passando com cuidado 
para não dar encontrões nos móveis, embalo esta menina 
que se calou mas está de olho muito aberto e quer brincar, 
e há um halo de luz parda a coar-se pelas persianas 
e às vezes uns faróis riscando estrias a correrem pelo tecto. 

levo-a bem presa ao colo, toda de porcelana pesadinha, 
enquanto a irmã está a dormir meio atravessada nos lençóis. 
ao chegar-me a outra janela vejo as luzes fugindo na auto-estrada 
em direcção ao rio, a uma placa da lua sobre o rio, 
e trauteio «já gostava de te ve-er», enquanto acendo o fogão 
para aquecer o leite e embalo a minha filha e a outra está a dormir. 

oxalá cresçam ambas airosas e bem seguras, 
e possam ir na vida serenamente como os rios correm, 
ou como os veleiros voam, ou como elas agora respiram 
em cadências regulares neste silêncio táctil. 
a meio da noite um homem acordou no sossego da casa 
e pôs-se a cuidar do sono das suas filhas pequenas. 

oxalá haja fadas benfazejas esvoaçando das histórias 
de princesas felizes e potros azul turquesa, e forrem esta casa, 
e pelas malvadas bruxas alegres sinos dobrem, 
e estas meninas existam incólumes e puras no seu quente contentamento, 
mesmo que o mundo vá girando numa ordem sobressaltada, 
mesmo que os mares agonizem nos seus gonzos de chumbo. 

lá fora os carros passam, ainda não é a manhã, só alta madrugada, 
mas passam alguns carros, deve estar frio. e há passos no andar de cima 
a minha filha teresa tosse e volta-se na cama, a minha mulher dorme, 
mas a joana ainda não adormeceu e presta a maior atenção 
e mexe-me na cara quando eu chego outra vez a «inda mal abria os olhos», 
já ouviu esta toada umas centenas de vezes e passa a mão pelo meu queixo 

e aconchega a cabeça e as pálpebras começam a baixar-lhe 
muito devagarinho e a pequenina mão abandona-se na gola do meu pijama 
e há que dar ainda uns passos para cá e para lá, 
a cantar uma sombra de modinha, para ela ficar bem adormecida, 
e como da irmã, quando a irmã tinha esta idade, eu digo 
que sei muito desta menina, e sei. e vou deitá-la outra vez.


 (Vasco Graça Moura,  in "O concerto Campestre")

Presto a minha homenagem,  e  manifesto aqui, toda a minha gratidão e o meu reconhecimento, a este  cidadão  exemplar,  no seu trabalho, no seu civismo, na sua humildade, na sua grandeza de alma e na sua  defesa da lingua portuguesa.
Dou muitas  graças, ao Deus-Criador, por ter trazido à  vida, um ser humano tão especial.

Oro, para que do Pai - Deus, consolador e misericordioso, venha a paz , o consolo e o encorajamento, para "as suas meninas"...assim como para toda a restante família e amigos.

Nota: Se quer saber mais sobre Vasco da Graça Moura leia aqui. (Clique em cima)


4 comentários:

esperança disse...

Boa noite maninha querida, que estejas aliviadinha das tuas dores.

Sei que ficaste triste, porque o grande poeta e tradutor Vasco da Graça Moura, que tu admiravas, e a quem dedicas esta linda homenagem, partiu para a eternidade, foi ter com os seus queridos que já o esperavam lá.
Ele recebeu o dom da poesia e não só, porque em tudo foi grande!!!....
Ao ler a sua poesia “Para uma Canção de embalar” que aqui publicas, constato que foi um dedicado marido e pai de família, e um dedicado amigo, pois reparei que tinha muitíssimos…E de todos os quadrantes políticos. E assim como, toda a gente sabe, dedicado há sua obra imensa!!!...

Tem, tenhamos todos uma noite tranquila.


Rosa disse...

Olá Viviana.
Foi o poeta, mas fica a sua (admirável) obra.


Abraços, Viviana, e as melhoras.

Viviana disse...

Querida maninha Esperança

Fiquei muito, muito triste...
Era um homem exemplar!
Notável!
Um ser humano lindo!

Lembrá-lo-hei sempre com imensa saudade e gratidão

Um abraço
Viviana

Viviana disse...

Querida Rosa

Sim, amiga.

E que obra e que exemplo ele nos deixa!...

Um beijinho
Viviana