O Poeta português Cesário Verde.Fonte da imagem: https://pt.wikipedia. |
PROVINCIANAS
I
Olá! Bons dias! Em Março
Que mocetona e que jovem
A terra! Que amor esparso
Corre os trigos, que se movem
Às vagas dum verde garço!
Como amanhece! Que meigas
As horas antes de almoço!
Fartam-se as vacas nas veigas
E um pasto orvalhado e moço
Produz as novas manteigas.
Toda a paisagem se doura;
Tíbida ainda, que fresca!
Bela mulher, sim senhora
Nesta manhã pitoresca,
Primaveral, criadora!
Bom sol! As sebes d'encosto
Das madressilvas cheirosas
Que entontecem como um mosto,
Floridas, ás espinhosas
Subiu-lhes o sangue ao rosto.
Cresce o relevo dos montes,
Como seios ofegantes;
Murmuram como umas fontes
Os rios que dias antes
Bramiam galgando pontes.
E os campo,s milhas e milhas,
Com povos d'espaço a espaço,
Fazem-se ás mil maravilhas;
Dir-se-ia o mar de sargaço
Glauco, ondulante, com ilhas!
Pois bem. O inverno deixou-nos,
É certo. E os grãos e as sementes
Que ficam doutros outonos
Acordam hoje frementes
Depois de uns poucos de sonos.
Mas nem tudo são descantes;
Por esses longos caminhos,
entre favais palpitantes,
Há solos bravos, maninhos,
Que expulsam seus habitantes!
É nesta quadra de amores
Que emigram os jornaleiros,
Ganhões e trabalhadores!
Passam clans de forasteiros
Nas terras de lavradores.
Tal como existem mercados
Ou feiras, semanalmente,
Para comprarmos os gados
Assim há praças de gente
Pelos domingos calados!
Enquanto a ovelha arredonda,
Vão tribos de sete filhos,
Por várzeas que fazem onda,
Para as derregas dos milhos
E molhadelas da monda.
De roda pulam borregos;
Enchem então as cardosas
As moças desses labregos,
Com altas botas barrosas
De se atirarem aos regos!
Ei-las que vêm ás manadas,
Com caras de sofrimento,
Nas grandes marchas forçadas!
Vêm ao itrabalho, ao sustento,
Com fouces, sachos, enxadas!
Ai o palheiro das servas
Se o feitor lhe tira as chaves!
Elas chegam ás catervas,
Quando acasalam as aves
E se fecundam as ervas!...
II
II
Ao meio - dia na cama,
Branca fidalga que julga
Das pequenas da su 'ama?!
Vivem minadas da pulga,
Negras do tempo e da lama.
Não é caso que comova
Ver suas irmãs de leite,
Quer faça frio, quer chova,
Sem uma mamã que as deite
Na tepidez duma alcova'!
(Cesário Verde . no livro - Cânticos do realismo e outros poemas)
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