O escritor português Ferreira de Castro |
Uma carta de Ferreira de Castro
Nunca pedia nada à minha Pátria, nunca pedi ou jamais recebi qualquer favor ou amparo oficial.
Hoje, porém, faço-lhe uma solicitação, ao mesmo tempo a primeira e a última; é tal, e morrerei com a esperança de que não me será negado. Peço ás entidades de Lisboa e de Sintra, das quais a anuência dependa, peço ás entidades existentes no momento da minha morte ou ás que lhe sucedam, se aquelas não me derem deferimento, que autorizem a realização da derradeira vontade que expresso aqui.
Tendo escrito a maior parte da minha obra em Sintra, onde tanto sonhei e trabalhei, eu desejaria ficar ali para sempre, entregue à protecção da sua poesia inesquecível e da sua beleza inefável. Desejaria ficar sepultado á beira de uma dessas poéticas veredas que dão acesso ao Castelo dos Mouros, sob as velhas árvores românticas que ali residem e tantas vezes contemplei com essa ideia no meu espírito. Ficar perto dos homens, meus irmãos, e mais próximo da Lua e das estrelas, minhas amigas, tendo em frente a terra verde e o mar a perder de vista. - o mar e a terra que tanto amei. ...
.....
... Se me for concedido aquele derradeiro lugar, eu desejaria que o meu caixão ficasse colocado dentro de um quadrilongo de cimento, coberto com placas de granito cimentadas e por cima uma camada de terra onde as ervas rasteiras vivessem livremente. Desejaria também que não houvesse nenhum atributo fúnebre, nada que recordasse a morte, mas apenas, ao lado da campa invisível, um bloco de granito cavado em forma de banco onde pudesse descansar quem por ali subisse ao castelo ou andasse, em erradíos passos, comungando com a poesia de Sintra, como milhares de vezes eu andei. Não pretendia nenhuma inscrição. Mas se alguma for precisa, como admitiu o dr. Álvaro Salema, ao ler o embrião deste documento, peço que seja limitada ás palavras «escritor Ferreira de Castro», discretamente gravadas nas costas do banco. Assim, não haverá no local qualquer ambiente funerário.
Hoje, vinte e cinco de Fevereiro de mil novecentos e setenta, com intensa emoção estou a escrever e a ver nitidamente aquele banco, a vê-lo como se ele já estivesse lá. E grandemente me comove a esperança de que os homens do meu país lhe darão realidade.
Lisboa, 25 de Fevereiro de 1970.
E, foi concedido o seu desejo.
Muitas vezes me sentei a descansar neste banco, com o meu pensamento no escritor, quando subia a Serra. |
No livro - IN MEMORIAM - de Ferreira de Casro
8 comentários:
Boa tarde maninha querida, que estejas benzinho.
Tenho andado com um pouco mais de afazeres, mas não deixo de vir ler os teus postes.
Muito interessante este do desejo e pedido do escritor Ferreira de castro. Desconhecia, gostei de saber…
Tem, tenhamos todos, um bom resto de dia.
Olha que coisa mais linda!
Desconhecia esta passagem, mas vê-se muito da alma de poeta.
Com as devidas distâncias, eu também tenho os meus belos desejos para quando chegar o meu fim aqui. Modéstia à parte, também têm poesia... a minha claro.
Shalom!
Olá Viviana.
Gostei de ler.
A Viviana sempre nos presenteia com "noticias" como esta, que para alguns, como eu, as desconhecia.
E já agora, vou contar o meu desejo final, que cantem muito e com muita alegria :))
Viviana, bom fim de tarde.
Abraços
Querida maninha Esperança
É verdade!
Ali descansa...
Um beijinho
Viviana
Querida Mimi
Imagino que sim...que tenha "os seus belos desejos"...
Eu também tenho.
Já há muito que preparei...
Tudo escritinho...
Um abraço
Viviana
Querida Rosa
Quem gosta de cantar...
Vai querer que lhe cantem...
É segredo, mas eu quero música clássica.
Está escolhida. A família sabe.
Um grande abraço
Viviana
Querida amiga
Desconhecia tudo isto, embora goste muito deste escritor.
Um Homem "enorme" até em humildade.
Também nunca fui ao castelo dos mouros,e por isso nunca vi este banco; apenas visitei o Palácio,os jardins, e cá em baixo a linda Vila de Sintra.
Que bom que a Viviana tenha um blog... e o gôsto de nos trazer estes conhecimentos.
Agradecimentos e um beijinho.
Dilita.
Querida Dilita
Obrigada por o seu comentário e as suas palavras, boa amiga.
Costumo dizer com frequência, que é uma benção viver a 15 minutos da bela Sintra.
Estou sempre lá caída...
Ainda ontem, anteontem, e não sei de daqui a pouco não estarei lá.
Nunca cansa.
Quanto mais se lá vai...mais se quer lá voltar a ir.
Um abraço
Viviana
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