Recebi de um grande amigo o texto que a seguir publico, e faço-o,
por considerar que tem a maior relevância para a Educação e Cultura Portuguesa.
«Escritor, tradutor e professor universitário português. É grande
especialista de línguas e literaturas clássicas, em particular de grego
clássico.
Wikipédia: Nascimento: 1963 (idade 55 anos), Lisboa.
Em 1910,
havia no mundo 600 milhões de cristãos.
Hoje,
esse número ultrapassa os 2,8 biliões.
O mundo
está a abarrotar de aderentes de uma religião cuja Escritura - o Novo
Testamento - foi escrita em Grego Antigo.
Nunca
entenderei por que razão a língua grega não é ensinada em todas as escolas,
universidades e locais onde se ministra «catequese» (seja ela catequese
católica, «escola dominical» protestante - ou seja o que for).
Como é
possível 2,8 biliões de pessoas confiarem em traduções necessariamente
imperfeitas da sua Escritura?
Quem tem
noção do que está a rezar quando reza o Pai Nosso? Quem percebe que o motivo
pelo qual comunga todos os domingos tem a ver com a escolha de um tempo verbal
(em detrimento de outro) numa frase específica do Evangelho de Lucas?
Só quem
se deu ao trabalho de estudar Grego Antigo pode ter alguma noção do que está em
causa nestas frases.
Quando
me perguntam qual é a principal razão pela qual os Estudos Clássicos não devem
morrer no sistema educativo do mundo cristão, a minha resposta é sempre: o Novo
Testamento.
Não
confiem nas traduções. Sejam cristãos exigentes e esclarecidos. Aprendam a
língua em que a Escritura cristã foi escrita e leiam-na por vocês mesmos, com
os vossos próprios olhos, com o vosso próprio cérebro: cheguem às vossas
conclusões pessoais sobre o que estão a ler. Não confiem na «papinha» já feita
por outrem. Nada substitui o confronto directo com o cerne da questão.
Por
outro lado, estudar Grego Antigo abre muitas outras portas. Ler, na língua
original, Homero, Platão e Aristóteles - ou Ésquilo, Sófocles e Eurípides - ou,
Tucídides, o mais inteligente de todos os historiógrafos: isto corresponde a
uma competência e a uma mais-valia de valor insubstituível. Como é possível que
tenhamos chegado, em Portugal, a este ponto de auto-ódio que é a negligência
com que o Grego tem vindo a ser tratado nas últimas décadas?
Digo-vos
sinceramente: quando leio os programas de Grego Antigo actualmente em vigor no
Reino Unido para o equivalente ao nosso 9.º ano, coro de vergonha.
Como
permitimos ficar neste analfabetismo no que toca às Línguas Clássicas?
Como se
explica que não percebamos - nós e quem nos governa há décadas - aquilo de que
estamos a privar geração atrás de geração?
Como
pode ter uma competência básica, basilar, alicerçante desaparecido no panorama
do nosso ensino? Como se explica que sejamos um povo que nem vê este buraco
hiante na formação escolar?
Com
carácter de urgência: o Grego Antigo tem de voltar em força
às nossas escolas e às nossas universidades. Sejamos exigentes: não deixemos
que outros pensem (ou traduzam) por nós.
.
Frederico
Lourenço
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