As Palavras da Solidão

Ontem, ao ler o Editorial da Revista Municipal, editada pela Autarquia de Sintra - a - minha Autarquia, encontrei este belíssimo texto escrito pelo Presidente da Câmara Dr. Fernando Seara - meu Presidente.

È do melhor que tenho lido sobre o assunto.

Revela-nos uma pessoa extremamente sensível e solidária para com os idosos, por isso achei que deveria "repartir" as suas palavras com aqueles que passam por este cantinho.

"È exactamente porque não há solidão que dizes que há solidão. Imagina que eras o único homem no universo. Imagina que nascias de uma árvore, ou antes, porque eu quero pôr a hipotese de que não há árvores, nem astros, nem nada com que te confrontes: supõe que o universo é só o vazio e que tu nascias no meio desse vazio, sem nada para para te confrontares. Como dizeres "eu estou sózinho"? Para pensares em "eu" e em "sózinho"tinhas de pensar em "tu" e em "companhia". Só há solidão "porque" vivemos com os outros..."

Vergílio Ferreira, in "Estrela Polar".

Não nasceram de uma árvore, nem no meio do vazio. Nasceram dos outros e vivem com os outros. Foram filhos , irmãos, pais e avós. Foram colegas de trabalho, cidadãos e construtores do Mundo. Criaram , transformaram, amaram. Os outros e a Vida. Deram-se em oferenda diária á família e á comunidade. Sofreram. Por eles, por nós e por todos. Foram muitos num só coração que bateu sempre e sempre na cadência do momento, embalando-nos neste diário peregrinar. Foram Santos e pecadores, confessos e apóstatas, militantes e indiferentes. Foram muito em tão pouco tempo.

E, aqui chegados, ganharam o vazio do presente, debruçados nas imagens do passado que projectam interiormente, como que aconchegando a alma e silênciando a lamúria que esá sempre, matreiramente, á espreita. Sós, com eles e com Deus. Isolados da vida que fervilha em seu redor e que passa sem os ver. Dependentes de um sorriso de quem criaram e amaram e tão rapidmente deles se esqueceu. Dependentes do abraço fraterno dos cuidadores e dos voluntários que os respeitam e os animam. E que os olham vendo-os como homens e mulheres, com nomes próprios e histórias de vida.

São cada vez mais, numa sociedade que os aprecia e considera cada vez menos. representam, nas suas rugas e debilidades, o futuro dos que os ignoram. Talvez por isso mesmo...

Esperam. Sim. Esperam. O seu dia - a dia é, aliás, feito de espera. Vivem neste Mundo confuso que fala uma linguagem estranha e parece querer libertar-se de si próprio...

Chamam-lhe velhos. Ou empregam um adocicado diminutivo: velhinhos.

E eles sorriem, desejando que quem assim os trata um dia o ,possa ser e, sendo-o , não sofra o que o isolamento a que os votaram os fez sofrer.

Estas palavras são escritas pensando nos muitos homens e mulheres de que a sociedade se esqueceu "arrumados" em instituições ou esquecidos e isolados em suas caas.

Antes de Presidente de uma Câmara, sou filho, pai e avô.Tudo num só momento. E percebo que só fazemos sentido sendo todos, mais do que a soma das partes, um corpo plural, multifacetado e interdependente.

A pessoa idosa, vértice deste corpo, requer essencialmente, o seu reconhecimento como Cidadã titular do inalienável direito ao respeito, á dignidade, ao bem- estar e á liberdade!

Fernando Seara

Presidente da Câmara Municipal de Sintra