segunda-feira, 12 de março de 2012

Não posso deixar de denunciar veementemente...

Mas que país é este?
Mas que sociedade é esta?
Como foi possível durante quarenta anos esta "adolescente"ter estado sequestrada pelo pai, fechada numa casa, incomunicável com o mundo exterior, a sofrer horrores, sem que ninguém tomasse uma iniciativa para a salvar, quando pelos vistos "toda a aldeia" estava a par do que se passava? É assustador pensar que em pleno século vinte e um, num país da União Europeia as coisas aconteçam assim.

Tomei conhecimento hoje á tarde, deste horror, e não posso deixar de o denunciar veementente. Conheço a aldeia pois há muitos anos atrás, mais precisamente há quarenta e sete anos, estive lá como enfermeira de saúde pública a fazer um curso sobre saúde, na Casa do povo, para a população.
Eis a notícia:

Avis: Mulher fechada em casa há quarenta anos

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Benavila - Avis
Fonte da imagem:
562.photobucket.com/


«Numa pequena aldeia de Avis, uma mulher vive enclausurada desde os 14 anos. Terá sido abusada e o pai mantém-na refém. Vive como um animal, com sinais de demência. O ‘segredo’ é conhecido por todos, mas poucos fizeram alguma coisa para a recuperar para a vida.

Está fechada em casa há quase meio século. A casa, onde Maria Perpétua Violante vai morrendo aos poucos, causa estranheza a quem chega. Se não se conhecesse a sua história, dir-se-ia que ninguém existe por trás daquelas paredes. Os vidros grossos e foscos de um verde estridente, ladeando a porta principal, ferem a simplicidade do restante casario, de rosto de cal e faixas amarelas ou azuis, que emboneca a aldeia alentejana de Benavila, junto à barragem do Maranhão (em Avis, Portalegre). A porta do n.º 2 da rua Dr. Júlio Varela da Conceição e Silva nunca se abre, nem para o carteiro, que há muito desistiu de bater.

Ao lado da entrada, a única janela que dá para a praça, sem cortinas, adensa o mistério. À direita, o vidro martelado impede a visita da luz e qualquer visibilidade para o interior. Na parte esquerda, colada ao vidro liso, uma placa de madeira castanha impede os olhares curiosos. De repente, a casa anima-se de uma ira que só a solidão movida por um terrível segredo explica. A placa de madeira desliza, não mais que a largura da palma de uma mão, e os olhos negros de Maria Perpétua, pendurados num rosto de lua cheia branco como a cal, descobrem o movimento inesperado na rua.

Num instante, Maria Perpétua atravessa a casa e refugia-se no pequeno quintal de muros altos onde o pai, cúmplice do seu cativeiro, arrasta lenha para a chaminé de barro que os aquece no rude Inverno. António Espinheiro, 91 anos, é a única companhia da filha. A mulher morreu há muito e, dos cinco filhos do casal, apenas restam Maria Perpétua e dois irmãos, que estão proibidos de entrar na casa e que, como tantos alentejanos, partiram em busca de melhor sorte. A voz da mulher, igual aos ganidos histéricos de um coiote, solta-se em imprecações e insultos contra o pai: «Está uma mulher à porta, seu c… Está uma mulher à porta, seu c…».

As explosões de raiva contra o pai são bem conhecidas das gentes da aldeia. O povo já não lhe adivinha o rosto, muito menos o sofrimento, apenas lhe conhece os gritos, as injúrias que parecem ser o seu único espaço de autonomia. Aos insultos, António responde sempre em tom inaudível, para não promover falatórios. Quando se pede uma descrição a partir das memórias que guardam da adolescente que com apenas 14 anos se enclausurou, só se obtém traços gerais. Dizem que tinha um espírito vivo, cabelos compridos sempre bem penteados, olhos sorridentes e voz de uma musicalidade maravilhosa. Era curiosa, procurava as coisas atrás das coisas.

Abusos na adolescência

Mas o mal que aflige Maria Perpétua, hoje com 55 anos, todos conhecem ou pensam conhecer. Já a tinham esquecido, remetida à condição de fantasma, quando o SOL entrou na aldeia para remexer no passado. De início, vizinhos e familiares pareciam participar no mesmo entusiasmo por libertá-la e assim se libertarem do fardo desagradável.

Bebiana Sombreireiro – uma das suas primas, que com ela partilhou os sonhos rosa da infância e adolescência – escuta, encostada ao portão de ferro, os mesmos sussurros desesperados. Foi a ela que Maria Perpétua confidenciou o seu drama, há 40 anos. A vergonha e o medo levaram-na a fazer um pacto que não mais quebrou: despegar-se do mundo, e fechar-lhe as portas.

Síndrome de Estocolmo

António Coimbra de Matos, decano dos psicanalistas em Portugal, passa em revista mais de meio século da sua vasta experiência, mas nunca viu nada assim. A atitude de Maria Perpétua enquadra-se na tão badalada ‘síndrome de Estocolmo’ – desvio mental desenvolvido pelas vítimas de sequestro e que ficou muito colado a Natascha Kampush, a garota austríaca sequestrada aos 10 anos por um pedófilo e que assim permaneceu até fugir em 2006, oito anos depois. «Esta mulher deve estar muito mal, numa loucura de isolamento. Vê o mundo apenas através do pai, com quem mantém uma relação ambivalente. Por um lado odeia-o, daí os insultos, por outro aceita, porque está na sua estrita dependência e ganhou medo ao mundo circundante».

O estado primitivo em que a mulher vive há quase meio século não escapa à análise: «Essa voz é de contacto social, de estímulos, vive como um bicho numa jaula». Coimbra de Matos deita também a aldeia no divã: «Todos se defendem e atiram a responsabilidade para o pai, mas os pais já não têm essa autoridade absoluta sobre os filhos. A aldeia foi de uma cumplicidade passiva e também não quer pôr a sua honra em causa. Isto é um caso para o Ministério Público, que tem como obrigação proteger os cidadãos indefesos. Se eu fosse delegado, já tinha feito uma conferência com o delegado de saúde e o psiquiatra da zona e afastava aquele pai, que está a impedir que a filha se trate. Isto pode ainda acabar como o caso de Beja, em que o pai matou e suicidou-se depois».

Foi feita há duas semanas uma denúncia ao Ministério Público da comarca de Avis. Nídia foi ouvida logo como testemunha e a prima Maximina também se deslocou ao tribunal, deixando os seus contactos, mas ainda não foi chamada. O pai de Maria Perpétua tomou conhecimento da presença de jornalistas e ninguém lhe põe a vista em cima. A própria aldeia fechou-se num silêncio frio. Maria Perpétua continua no cárcere e, abalada pelas vozes de quem passa na rua, espreita como um animal treinado para afastar estranhos. E assim vai ficar, até ser demasiado tarde para a ajudarem.»

Por Felícia Cabrita

http://sol.sapo.pt/inicio/Sociedade/Interior.aspx?content_id=4370

3 comentários:

dilita disse...

Querida Viviana

40 anos não são 40 dias. Como foi possível manter-se esta tragédia durante tanto tempo,havendo familiares e visinhos (pois a aldeia é pequena)conhecedores dos factos...
Que tristeza. Assim se permite matar a fogo lento... eu nem tenho palavras.
Beijinho,boa Viviana.

Sandra Veneziani disse...

Oi,minha linda e doce Viviana....
Leio sempre seus postes,viu,,a verdade é que nada fica escondido...
Deus está nocontrole de todas as coisas..certamente Ele permitiu isso..Ele tem seus propósitosna vida de todos os envolvidos. Certamente alguem tinha conhecimento disto e calou-se.Esperamos em Deus mas temos que fazer a nossa parte. amemo-nos uns aos outros....
querida estou sem computador...ele pifou.
Quero saber como a irmã está,familia,ministerio e sua linda vida.
Aproveito,pra pedir oração..dia 16/3 as 11:30 horas estarei fazendo uma punção aspirativa da tireóide,tenho nodulos e vou precisar operar.
Peço,que o Senhor me dê paciência,força e coragem pra enfrentar o que estiver por vir.Obrigada ! Viviana,que a presença de Jesus seja constante em sua vida.
beijos da san

Lilá(s) disse...

Também pasmei quando li a noticia!
Bjs