Faz hoje 85 anos (19/01/23) que na Póvoa da Atalaia - Fundão - nasceu José Fontinhas, que viria a usar o pseudónimo de Eugénio de Andrade, um dos grandes nomes da poesia portuguesa contemporânea. Nasceu de um amor juvenil. A mãe, Maria dos Anjos, era filha de trabalhadores modestos. O pai, de família proprietária mais abastada, partiu para Lisboa sem casar nem perfilhar o bébé.O casamento veio a realizar-se mais tarde mas durou pouco e quando o pai quiz perfilhá-lo, Eugénio recusou. Fez da mãe a figura central da sua poesia, de onde o pai está quase ausente. Em entrevistas referia-se a ele : "O senhorito do Monte da Ribeira da Orca". Viveu parte da sua infância na Beira; ainda menino foi com a mãe para Castelo Branco e depois para Lisboa onde vive e estuda. Escreve os primeiros poemas com 13 anos. Entretanto começa a usar o pseudónimo de Eugénio de Andrade. Depois passa alguns anos em Coimbra e daqui visita Espanha e França. Inicia a sua vida de profissional como inspector dos Serviços Médico - Sociais (antiga Caixa de Previdência) onde trabalha até 1980. Em 1950 muda-se para a cidade do Porto, Rua Duque de Palmela, onde fica até ir para a sua última casa, na Foz, sempre acompanhado de livros, quadros, flores e gatos. Desejava muito ir á Grécia , mas para o conseguir teve de vender algumas coisas que lhe eram caras.Mais tarde voltou á Grécia várias vezes. Na casa onde vivia, na Foz, criou em 1995 a Fundação Eugénio de Andrade. " A poesia de Eugénio de Andrade , está entre as mais belas coisas produzidas pela natureza", disse o poeta brasileiro Eucanaã Ferraz. Enquanto o poeta Mia Couto - apelida a escrita de Eugénio de : "Um dos momentos mais raros da poesia portuguesa".São de Eugénio estas palavras: "O silêncio é o meu fascínio. A minha necessidade dele é crescente e cada vez se torna mais difícil obtê-lo." Ficou doente durante 3 anos e já sem poder ler ou escrever, pois não tinha nem sequer força para pegar na caneta, ditava versos á mãe do seu afilhado que os escrevia. Morreu durante o sono, no dia 13 de Junho de 2005, ás 3,30 horas da manhã, com uma paragem cardio - respiratória. O seu afilhado encontrou-o de olhos fechados com uma expressão serena, sem sofrimento, e foi feito conforme o seu desejo: Quis ser enterrado de pijama e chinelos de quarto. Descobri a sua poesia há muito pouco tempo mas admiro-a muito, mexe comigo... Eugénio de Andrade é com Miguel Torga e Teixeira de Pascoaes, meu mpoeta preferido. Hoje, quero prestar-lhe a minha homenagem e agradecer-lhe tudo de belo que nos deixou. O texto vai longo, mas não posso deixar de de neste dia, vos oferecer um dos seus belos poemas:
Algumas reflexões sobre a mulher
Elas são as mães:
Rompem do inferno, furam a treva,
Arrastando
Os seus mantos na poeira das estrelas.
Animais sonânbulos,
Dormem nos rios, na raíz do pão.
Na vulva sombria
é onde fazem o lume:
Ali têm casa.
Em segredo, escondem
o latir lancinante dos seus cães.
Nos olhos, o relâmpago
negro do frio.
Longamente bebem
o silêncio
nas próprias mãos.
O olhar
desafia as aves:
o seu voo é mais fundo.
Sobre si se debruçam
a escutar
os passos do crepúsculo.
Despem~se ao espelho
para entrarem
nas águas da sombra.
È quando dançam que todos os caminhos
levam ao mar.
São elas que fabricam o mel,
o aroma do luar,
o branco da rosa.
Quando o galo canta
desprendem-se
para serem orvalho.
(Eugénio de Andrade)
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